Kiss 10 anos

Impunidade e prevenção de incêndios são debatidas na programação dos 10 anos da tragédia na Kiss

Foto: Eduardo Ramos (Diário)
Neste sexta-feira (27), a programação dos 10 anos da tragédia na boate Kiss contou com dois painéis para discutir impunidade e prevenção de incêndios, na Praça Saldanha Marinho.

O caso Kiss: até quando a justiça vai servir a impunidade?

O primeiro bate-papo, denominado “O caso Kiss: até quando a justiça vai servir a impunidade?”, começou por volta das 16h15min, com a presença de Tâmara Biolo Soares, Paulo Carvalho e Pedro Barcellos Jr.

  • Tâmara Biolo Soares é a responsável pela caso em andamento na Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Esse processo alega violação do direito à vida, integridade e justiça por parte do Estado Brasileiro contra vítimas, sobreviventes e familiares da boate Kiss.
  • Paulo Carvalho é diretor jurídico da AVTSM e pai de uma das vítimas, Rafael Nunes de Carvalho.
  • Pedro Barcellos Jr. é advogado e assistente de acusação no processo penal do caso Kiss.

Tâmara começou falando sobre a importância da programação dos 10 anos da tragédia na Kiss. Ela se emocionou ao falar que trouxe a família para conhecer e ver de perto a luta das famílias das vítimas e sobreviventes.

– Esses dias são de aprendizado, ensinamento, de construção de memória e história. Se a justiça permanece cega, que a cultura, a opinião pública e o jornalismo os puna (réus do caso Kiss).

Na sequência, Tâmara criticou os processos longos e falhos da Justiça brasileira. Ela citou como exemplo a espera de nove anos pelo júri da Kiss, que acabou sendo anulado seis meses depois.

– A Justiça não está preparada para este tipo de caso. Essa anulação foi absurda e inadmissível. Claro que não se pode ter uma lei para cada caso, mas é preciso que a lei processual não impeça a justiça.

Diante da omissão da Justiça perante a tragédia, em fevereiro de 2017, a AVTSM apresentou uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). O Estado brasileiro foi notificado em fevereiro de 2022 e, quatro meses depois, mandou a defesa para o órgão. Agora, a CIDH deve definir a admissibilidade do caso, ou seja, se efetivamente o caso vai ter início.

Conforme Tâmara, a denúncia da AVTSM pede que o Estado brasileiro reconheça sua responsabilidade no incêndio da Kiss e peça desculpa às vítimas, sobreviventes e familiares; pague indenizações; faça reformas nas leis de prevenção e investigue os responsáveis pela tragédia.

Em seguida, o advogado Pedro Barcellos Jr. relembrou as etapas jurídicas do Caso Kiss desde 2013 e explicou os próximos passos do caso, após a anulação do júri:

– Já entraram os recursos de acusação e as contrarrazões. Agora, o próximo passo é Brasília. O relator no Superior Tribunal de Justiça vai dar vista ao Ministério Público Federal para manifestação e depois vai levar (o processo) à turma de cinco ministros para votação.

O advogado tem esperança que, em Brasília, o processo vai ter uma resposta mais rápida e atenciosa:

– Eu acredito que, quando chegar em Brasília, essa situação vai ser vista com outros olhos. Esse processo demanda um carinho diferente.

Já o diretor jurídico da AVTSM, Paulo Carvalho, reforçou que a Kiss não foi uma fatalidade:

– Nós ainda estamos buscando a justiça porque tem pessoas que não têm respeito a vida. A ganância e a omissão provocam tragédias.

Ele relatou que, em 2009, a boate Kiss já tinha uma série de irregularidades. Assim, segundo ele, a tragédia poderia ter acontecido em qualquer momento entre 2009 e 2013. Carvalho ainda fez uma retrospectativa histórica da luta pela justiça dos pais das vítimas e sobreviventes. Na finalização, Carvalho trouxe o questionamento:

– Boate Kiss: esse nome será sinônimo de impunidade no Brasil ou sinônimo do marco civilizatório no combate ao crime daqueles que assumirem o risco da vida alheia?

Independentemente da resposta, Carvalho salientou que a luta vai continuar:

– Nada nos afastará dessa busca por justiça. Custe o que custar, leve o tempo que for. Não será em vão.

Por que a prevenção vale a pena?

O segundo painel “Por que a prevenção vale a pena?”, teve início por volta das 17h30min. Os participantes foram Antonio Berto, engenheiro pesquisador do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e gerente técnico do Laboratório de Segurança ao Fogo e Explosões, e Rogério Lin, superintendente da ABNT e especialista em proteção passiva contra o fogo.

Antonio Berto falou sobre erros e omissões na segurança contra incêndios de edificações. O engenheiro comentou sobre o acompanhamento e as avaliações de campo de proteção contra incêndio, que realiza no IPT desde 1976.

– Segurança contra incêndio dependende de regulamentação, normas, certificação e fiscalização - explicou.

Conforme Berto, no Brasil, a realidade é a predominância de projetos insatisfatórios e edificações com graves problemas:

– Não se iludam que o problema era somente aqui na boate Kiss em Santa Maria. Inúmeros erros e omissões na resolução contra segurança de incêndio nas edificações. Sobra muito pouco para apontar como acerto.

Dentre alguns problemas pontuais apontados pelo especialista, estão a desvalorização da área, a deficiência da regulamentação e dos processos de fiscalização, insuficiência dos serviços de corpo de bombeiros, deficiência de dados e de investigação de incêndios e ausência de coordenação na área de segurança contra incêndio.

Após a apresentação de Antonio Berto, Rogério Lin falou sobre a necessidade de boas técnicas para a segurança contra incêndio, tais como metrologia (estudo das medidas), normalização técnica, avaliação de conformidade e creditação (quem pode realizar esse trabalho).

–Temos quase dez incêndios por hora em edificações reportados no Brasil. O incêndio está no nosso dia a dia, não é uma coisa que acontece por acaso.

Lin ainda fez críticas à Lei Kiss, indicando a necessidade de mais objetividade nos cuidados direcionados as normas de reação e resistência ao fogo.

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Laura Gomes

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